Enquanto a OMS (Organização Mundial de Saúde) confirmava mais de meio milhão de infectados e 20 mil mortos pelo novo coronavírus, as previsões mais otimistas para a conclusão da fabricação das vacinas indicavam apenas para meados de 2021.
Por que, num cenário de pandemia e preocupação generalizada, sua distribuição pode demorar mais de um ano? E quais são as etapas do processo de criação de uma vacina? Para Renato Mancini Astray, pesquisador científico de vacinas virais do Instituto Butantan, em São Paulo, o prazo dado foi razoável.
“São necessários alguns anos [para se concluir a fabricação de uma vacina]. Normalmente, mais de cinco”, diz Astray. O cientista explica que é possível separar estas etapas em três processos principais: descoberta, desenvolvimento e testes clínicos.
Entenda as etapas de fabricação da vacina
Na descoberta, segundo o cientista, são testados diversos antígenos (substâncias para produção de anticorpos), parte que confere a imunidade ao agente viral. Nessa etapa, se inclui a forma como esse antígeno poderá ser produzido, como ele poderá ser formulado e qual a sua quantidade ideal.
Dessa forma, o teste mais determinante desta fase, como explica Astray, “é a prova de conceito, na qual se demonstra que animais de laboratório uma vez imunizados com a preparação tornam-se imunes ao patógeno (causador da doença) relacionado”.
A fase de desenvolvimento se dá quando o protótipo vacinal é estudado com a intenção de se criar um produto a partir dele. São abordados, durante a etapa, aspectos como a produtividade, pureza final e estabilidade da vacina em diferentes condições. O passo importante desta fase é o TPP (Target Product Profile, em inglês), que indica e descreve qual será o público alvo do produto, suas características desejáveis e sua estratégia de administração, entre outras coisas.
Ao chegar à fase de testes clínicos o protótipo já tem características próprias de um potencial produto. Ela se divide em três etapas finais: demonstrar ausência de toxicidade; mostra imunogenicidade (potencial de uma medicação em provocar estas respostas imunes); demonstrar eficiência.
Segundo o cientista, são muitos os cuidados ao longo destes processos, “desde o cuidado escolher uma forma viável de produzir a vacina para os testes, significando uma preparação segura e economicamente viável, até cuidados com a toxicidade e efetividade da preparação”.
Quais burocracias fabricadores devem cumprir
Existem, ainda, alguns trâmites burocráticos ao longo do processo de criação, fabricação e distribuição de uma vacina. Renato Astray explica que há uma legislação específica e revisada com frequência pela Anvisa, além da necessidade de se produzir a vacina em condições de Boas Práticas de Fabricação (Inmetro), o que, de acordo com ele, “exige investimentos altos para a construção de uma fábrica de vacinas”.
Assim, a Anvisa afirma que sua regra para a fabricação de vacinas é “basicamente a mesma dos países que são referência em medicamentos e vacina no mundo”. Após os produtos estarem prontos, a agência faz a análise dos dados da vacina para validar suas informações de segurança e eficácia.
Em nota, a Anvisa assegurou que os produtos e insumos voltados para o combate à Covid-19 tem recebido prioridade total de análise pela agência.
Busca pela vacina contra a Covid-19
Para então se chegar a uma vacina contra o novo coronavírus, explica Astray, é preciso entender a imunologia relacionada à infecção por coronavírus. Em um primeiro momento, segundo ele, os estudos se baseiam no que se sabe sobre outras versões do coronavírus que causaram epidemias, como o SARS e o MERS.
Em seguida, deve ser feita uma preparação precisa para mostrar a eficiência em testes em animais, seguindo para os testes em humanos. Por fim, conclui, “a construção de estrutura produtiva e aprovação por agências reguladoras”.
Dessa forma, na busca pela vacina contra a Covid-19, institutos e indústrias de diversos países aceleraram suas pesquisas e encurtaram os prazos para a fabricação de uma vacina para entre 12 a 18 meses.
Entretanto, uma nova previsão animou aqueles que esperam pela chegada mais breve das vacinas: na última segunda (30), a Johnson & Johnson anunciou que cofinanciará, ao lado da Barda (Biomedical Advanced Research and Development Authority), agência dos Estados Unidos, uma vacina que poderá estar pronta ao início de 2021.
Também nos EUA, o KPWHRI (Kaiser Permanente Washington Health Research Institute) foi a primeira organização a realizar pesquisas por uma vacina contra o vírus. Os trabalhos em Seattle são financiados pelo NIH (National Institutes of Health). Na Alemanha, o laboratório Pfizer e a startup BioNTech trabalham juntos em busca do antídoto.
A China provavelmente terá mais de uma pesquisa por vacinas contra a covid-19. Anunciada pelo governo chinês, a Academia Militar de Pesquisa Médica, ligada à Academia Militar de Ciências, lidera um dos estudos, e, a partir de abril, outras instituições iniciarão trabalhos em busca de uma vacina.
No Brasil
No Brasil, pesquisadores do Laboratório de Imunologia do Instituto do Coração (Incor) da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) lideram uma pesquisa por vacinas feitas por meio de partículas artificiais parecidas com o novo coronavírus. Ainda não há, porém, previsão para a conclusão dos trabalhos. Entretanto, os cientistas esperam que a vacina já seja testada em animais nos próximos meses.
Com informações ND Online