Eleito pela terceira vez consecutiva deputado federal pelo PSOL do Rio de Janeiro, Jean Wyllys vai abrir mão do novo mandado.
Em entrevista exclusiva à Folha, o parlamentar eleito com 24.295 votos e que está fora do país, de férias, revelou que não pretende voltar ao Brasil e que vai se dedicar a vida acadêmica.
Desde o assassinato da sua correligionária Marielle Franco, em março do ano passado, Wyllys vive sob escolta policial. Com a intensificação das ameaças de morte, comuns mesmo antes da morte da vereadora carioca, o deputado tomou a decisão de abandonar a vida pública.
“O [ex-presidente do Uruguai] Pepe Mujica, quando soube que eu estava sendo ameaçado de morte, falou para mim: ’Rapaz, se cuide. Os mártires não são heróis’. E é isso: eu não quero me sacrificar”, justifica.
De acordo co mWyllys, também pesaram em sua resolução de deixar o país as recentes informações de que familiares de um ex-PM suspeito de chefiar milícia investigada pela morte de Marielle trabalharam para o senador eleito Flávio Bolsonaro durante seu mandato como deputado estadual pelo Rio de Janeiro.
“Me apavora saber que o filho do presidente contratou no seu gabinete a esposa e amãe do sicário”, afirma Wyllys. “O presidente que sempre me difamou, que sempre me insultou de maneira aberta, que sempre utilizou de homofobia contra mim. Esse ambiente não é seguro para mim”, acrescenta.
Primeiro parlamentar assumidamente gay a encapar a agenda LGBT no Congresso Nacional, Wyllys se tornou um dos principais alvos de grupos conservadores, principalmente nas redes sociais. Ele também se diz “quebrado por dentro” em virtude de fake News disseminadas a seu respeito, mesmo tendo vencido pelo menos cinco processos por injúria, calúnia e difamação.
“A pena imposta, por exemplo, ao Alexandre Frota não repara o dano que ele produziu ao atribuir a mim um elogio da pedofilia. Eu vi minha reputação ser destruída por mentiras e eu, impotente, sem poder fazer nada. Isso se estendendo à minha família. As pessoas não têm ideia do que é ser alvo disso”, afirmou Wyllys.
Deputado eleito pelo PSL de São Paulo, Frota foi condenado em primeira instancia na Justiça Federal em dezembro do ano passado, a pagar uma indenização de R$ 295 mil por postar uma foto de Jean Wyllys acompanhada de uma declaração falsa: “A pedofilia é uma prática normalç em diversas espécies de animal, anormal é o seu preconceito”.
Wyllys se ressente, sobretudo, da falta de liberdade no Brasil. “Como é que eu vou viver quatro anos da minha vida dentro de um carro blindado e sob escolta? Quanto anos da minha vida não podendo frequentar os lugares que eu frequento?”, questiona.
Também avisa que vai se desconectar das redes sociais temporariamente e que não pretende acompanhar a repercussão do seu anúncio.
“Essa não foi uma decisão fácil e implicou em muita dor, pois estou com isso também abrindo mão da proximidade da minha família, dos meus amigos queridos e das pessoas que gostam de mim e me queriam por perto”, explica.
Sobre o futuro, ele ainda não tem planos definidos. “Eu acho que até dizer que vou pra Cuba”, ironiza.
Quando você decidiu abrir mão do mandato?
Eu já tinha pensado em abrir mão da vida pública desde que passei a viver sob escolta, quando aconteceu a execução da Marielle. Antes disso, havia ameaças de morte contra mim e, curiosamente, não havia contra ela. Nunca achei que as ameaças de morte contra mim pudessem acontecer de fato. Então, nunca solicitei escolta.
Mas, quando rolou a execução da Marielle, tive noção da gravidade. Além dessas ameaças de morte que vêm desses grupos sicários, de assassinos de aluguel ligados a milícias, haviam uma outra possibilidade: o atentado praticado por pessoas fanáticas religiosas que acreditam na difamação sistemática que foi feita contra mim.
Com informações Folha UOL