Os recentes casos de violência registrados no período eleitoral no Brasil representam uma ameaça não só às pessoas que têm opiniões diferentes umas das outras, mas também às instituições democráticas. A opinião é de especialistas, que defendem uma postura imediata dos candidatos a favor do respeito e da tolerância entre ideologias diferentes.
Na madrugada de segunda-feira (9), um professor de capoeira foi morto, em Salvador, na Bahia. Segundo as investigações, a vítima foi morta após declarar que tinha votado em Fernando Haddad (PT) à Presidência. Em Curitiba, a Polícia Civil investiga se a agressão contra um homem, nas proximidades da Universidade Federal do Paraná (UFPR), também teve motivação política.
No dia 6 de setembro, o candidato Jair Bolsonaro (PSL) foi esfaqueado durante um ato de campanha, em Juiz de Fora, no interior de Minas Gerais. O suspeito confessou o crime e alegou que era contra as propostas do político.
Para a professora do curso de Psicologia da Fundação Universidade Regional de Blumenau (FURB), Catarina Gewehr, as divergências de opinião são necessárias não somente para o país, mas também para a própria existência da humanidade.
— Estamos em um ponto de virada em que nunca fomos tão desafiados a enxergar quem pensa diferente como alguém que tem esse direito — afirma.
Gewehr lembra que as discussões políticas já chegaram aos consultórios de psicologia. Ela diz que muitas famílias relatam terem problemas de separação por causa de brigas mais acaloradas.
— Estamos em uma esquizofrenia social. As pessoas criaram um inimigo, alimentaram o inimigo e não perceberam que essa fantasia podia ameaçar vidas — diz, lembrando que muitos dos esquemas de corrupção e as possíveis ameaças à democracia que os candidatos atuais podem representar são construções que não devem se alterar, independente de quem for eleito.
Gewehr faz um alerta sobre os casos de violência. Para ela, essa polarização tende a aumentar gradativamente os casos de pessoas sofrendo com depressão e com o transtorno de ansiedade. Ela explica que quando uma amizade ou laço familiar é quebrado, as pessoas podem perder os referenciais que possuem.
— O ato da democracia está fundamentalmente ligado à perspectiva do diálogo. Não há democracia sem diálogo — frisa.
Para o professor de administração pública e pesquisador em Cultura Política, Daniel Pinheiro, da Universidade Estadual de Santa Catarina (Udesc), essa divisão de lados que se acentuou nos últimos meses já era perceptível na última campanha presidencial. Ele lembra que isso tem a ver com a crise de representatividade dos políticos, em que o povo não enxerga neles a defesa da vontade popular.
Pinheiro acredita que essa polarização também traz à tona traços de preconceito com quem pensa diferente, algo que o Brasil já se encaminhava para eliminar, na visão dele.
— Ao final da apuração houve uma onda de mensagens contra catarinenses ou contra nordestinos por causa da quantidade de votos que um candidato recebeu em uma região ou outra. A longo prazo, é uma situação perigosa. Retoma valores que a gente já deveria ter largado, de origem étnica e local, que não poderiam acontecer — afirma.
Violência de todos os lados
O sociólogo Sérgio Saturnino, da Universidade do Vale do Itajai (Univali), lembra que quem está na própria bolha, defendendo um ou outro lado da discussão, tende a esquecer que ambos já protagonizaram atos de violência.
— Eu não consigo perceber a violência que eu emito e só percebo a que eu recebo — diz Saturnino.
O papel dos candidatos na pacificação
Os especialistas são unânimes em afirmar que os candidatos que chegaram ao segundo turno, Bolsonaro e Haddad devem se pronunciar contrários à violência e pedir calma às respectivas militâncias.
Gewehr acredita que essa postura é necessária não só para acabar com a violência em curto prazo, mas para garantir a paz nos dias seguintes à eleição do segundo turno.
— Independente de quem ganhe, o país está quebrado. Eles teriam que tomar uma postura ética. Se não houver essa conclamação de uma pacificação. Nós vamos ter manifestações bem piores — prevê.
Pinheiro lembra ainda que os candidatos estão na mídia o tempo todo, devido à eleição e que eles deveriam aproveitar essa oportunidade.
— Não adianta falar que o outro está com discurso de ódio. Eles precisam falar diretamente com o eleitor deles. Eles precisam pedir esse controle — afirma.
Além do posicionamento, Saturnino afirma que os candidatos devem ser espelhos para os próprios eleitores.
— É preciso dar exemplo. Os candidatos precisam mostrar para que quem faça aquilo não está de acordo com aquilo que eles pensam — diz.
Com informações Diário Catarinense