Com o tema “Sonoros Ofícios – Cantos de Trabalho”, o Sonora Brasil Sesc chega a Santa Catarina em novembro, trazendo grupos do Nordeste e do Sudeste, que apresentam a música como expressão de atividades laborais do campo e da cidade. Três deles representam formas tradicionais relacionadas a trabalhos rurais: Destaladeiras de Fumo de Arapiraca e Mestre Nelson Rosa, de Alagoas; Cantadeiras do Sisal e Aboiadores de Valente, da Bahia; e Quebradeiras de Coco Babaçu, do Maranhão; já o Grupo Ilumiara, de Minas Gerais, é formado por músicos pesquisadores de diversas vertentes do tema.
Em formato de mostras musicais, o projeto circula por 23 cidades catarinenses, Em Caçador, o projeto acontece nos dias 22/11 no auditório da UNIARP, dia 23/11 no IFSC e dia 24/11 no auditório do Senac. Todos os dias as apresentações começam às 20h. A programação detalhada pode ser consultada aqui.
Os cantos de trabalho são, na maioria das vezes, uma prática coletiva e podem cumprir funções diferenciadas, de acordo com as características do trabalho ao qual estão relacionados e com os determinantes culturais e sociais de cada região ou localidade. Normalmente entende-se que o papel de aliviar o desgaste físico e aumentar a produtividade é preponderante, mas também pode servir como modo de externar o lamento e a crítica.
“Esta edição do Sonora Brasil nos proporciona chegar mais perto e conhecer algumas das sonoridades tradicionais do nosso país, toda a influência musical dos povos originários e as transformações que as comunidades foram vivenciando ao longo do tempo com as migrações e imigrações. Esses cantos dão ritmo ao trabalho. É a música ligando as pessoas, dando coesão e sentido de coletividade aos grupos na labuta diária”, declara a gerente de Cultura do Sesc em Santa Catarina, Maria Teresa Piccoli.
O grupo Destaladeiras de Fumo de Arapiraca e Mestre Nelson Rosa (AL) é formado por cinco mulheres da região de Sítio Fernandes, município de Arapiraca e por Nelson Rosa, mestre de coco de roda. Os cantos das destaladeiras são entoados em várias vozes, com uma só voz no improviso dos versos tirado pelas líderes do salão. São em forma de trovas rimadas e têm como característica serem arrastados e sem acompanhamento instrumental.
As Cantadeiras do Sisal e Aboiadores de Valente (BA) é um grupo formado por seis mulheres e dois homens da região de Valente. O repertório das cantadeiras, entoado em grupo durante a produção do artesanato, é formado por cantigas conhecidas desde a infância e outras de uma memória mais recente. Já o aboio “pé duro” é a ferramenta de trabalho dos aboiadores e as toadas são sua companhia das horas de descanso no campo.
Formado por cinco músicos pesquisadores de diversas vertentes do tema, o grupo Ilumiara (MG) é único que não está relacionado a uma prática da tradição. O grupo traz em seu espetáculo a contextualização histórico-social dos cantos de trabalho no Brasil e interpreta vissungos, cantigas de ninar, canto de lavadeiras, entre outros, em arranjos elaborados a partir de uma visão estética contemporânea.
A mostra dedicada aos cantos de trabalho integra a 18ª edição do Sonora Brasil – Formação de Ouvintes Musicais, projeto nacional do Sesc, que tem a proposta de despertar um olhar crítico sobre a produção e sobre os mecanismos de difusão de música no país. A ação possibilita às populações contato com a diversidade da música brasileira e contribui para o conjunto de ações desenvolvidas pelo Sesc, visando à formação de plateia. O biênio 2015/2016 tem como temas “Cantos de trabalho” e “Violas Brasileiras”, que circulou pelo Estado em 2015. O Sonora Brasil promoveu no ano passado 430 concertos em mais de 120 cidades brasileiras. Todas as apresentações são essencialmente acústicas, valorizando a qualidade sonora das obras e de seus intérpretes.
CRONOGRAMA MOSTRA SONORA BRASIL EM CAÇADOR
+ http://ww2.sesc-sc.com.br/projeto/8
Caçador
Destaladeiras de Fumo de Arapiraca e Mestre Nelson Rosa (AL): 22/11
Auditório da UNIARP, Rua Victor batista Adami, 800
20h00
Cantadeiras do Sisal e Aboiadores de Valente (BA): 23/11
IFSC – Instituto Federal de Santa Catarina, Av. Fahdo Thomé, 3000
20h00
Ilumiara (MG): 24/11
Auditório do Senac, Av. 7 de Setembro, 169
20h00
ENTRADA FRANCA
+ Sobre os grupos:
DESTALADEIRAS DE FUMO DE ARAPIRACA E MESTRE NELSON ROSA
Grupo formado por cinco mulheres da região de Sítio Fernandes, município de Arapiraca, na zona rural do agreste alagoano, e Nelson Rosa, mestre de coco de roda reconhecido como patrimônio vivo do estado de Alagoas. O cultivo do fumo foi a principal atividade econômica por mais de cinco décadas em Arapiraca, as mulheres trabalhavam horas a fio sentadas no chão nos “salões de fumo”, destalando e selecionando as folhas ao som de cantigas entoadas para espantar o sono durante as madrugadas.
Os cantos das destaladeiras são entoados em várias vozes, com uma só voz no improviso dos versos geralmente tirado pelas líderes do salão; são em forma de trovas rimadas e têm como característica serem arrastados e sem acompanhamento instrumental. O grupo traz no repertório, além das canções tradicionalmente entoadas na rotina laboral da destalação, cantigas de barreiro e tapagens de casa, os rojões de eito entoados nas tarefas da roça e o pagode, música que embalava as festas em que a comunidade comemorava o chamado derradeiro dia de fumo, no encerramento da safra. O grupo é formado por Josefa Correia Lima dos Santos, Isabel Cipriano dos Santos, Regineide Rosa dos Santos, Rosália Gomes dos Santos e Rosinalva Farias dos Santos, além de Mestre Nelson Rosa.
CANTADEIRAS DO SISAL E ABOIADORES DE VALENTE
A cidade de Valente está situada no nordeste da Bahia, a 240 quilômetros de Salvador, na principal região produtora de sisal do país. Tem cerca de 27 mil habitantes e sua economia gira em torno da produção e beneficiamento desta planta que é transformada, principalmente, em fibras e cordas, mas também em tapetes e outros produtos. Na região também se concentram fazendas dedicadas à agropecuária bovina e caprina, o que justifica a presença de aboiadores. Conta-se que o nome da cidade, emancipada em 1958 e anteriormente denominada Vila Boi Valente, faz referência a um boi que um dia se desgarrou da boiada e depois de muito ser perseguido morreu afogado numa cacimba.
As cantadeiras do sisal são mulheres que trabalharam por muito tempo nas várias etapas de produção da fibra, desde o plantio até a fabricação dos produtos derivados, e que hoje são artesãs, ofício que aprenderam a partir de projetos desenvolvidos na região com o objetivo de criar alternativas de trabalho para as mulheres que desenvolviam atividades pesadas e mal remuneradas no ciclo de produção do sisal.
Ailton Aboiador e Ailton Jr., pai e filho, são aboiadores reconhecidos na região. O pai trabalhou por muitos anos na lida com o gado, transportando boiadas pelos campos do semiárido baiano. O aboio “pé duro” foi sua ferramenta de trabalho e as toadas foram sua companhia das horas de descanso no campo. O filho, desde criança acompanhava seu pai na lida com o gado e já na adolescência formava dupla cantando aboios e toadas.
QUEBRADEIRAS DE COCO BABAÇU
O grupo é formado por oito mulheres que trabalham na quebra do coco babaçu desde a infância e hoje também exercem o importante papel de liderança na defesa e valorização do trabalho das quebradeiras, na preservação e na garantia de acesso às áreas de ocorrência da palmeira do babaçu. Atuam politicamente por meio da Associação em Áreas de Assentamento no Estado do Maranhão (Assema) e do Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB), que está sediado em São Luís e engloba seis regionais organizadas em três municípios maranhenses e outros três localizados no Piauí, em Tocantins e no Pará. O MIQCB foi criado na década de 1980 e sua atuação tem contribuído de maneira consistente para a melhoria das condições de trabalho e da qualidade de vida das pessoas envolvidas nesta atividade.
A prática do canto durante a quebra do coco e durante a caminhada para os babaçuais é uma experiência que trazem desde a infância, quando acompanhavam os mais velhos, geralmente mães e avós, na lida diária. Época em que a criança participava ativamente no trabalho da agricultura na zona rural em diversas regiões do país e que o acesso à escola era algo raro. Época em que o repertório era simplório e narrava fatos do cotidiano ou aludiam ao universo infantil através de cantigas de roda, algumas facilmente reconhecidas por estarem presentes na maior parte do país. Mas o repertório que prevalece hoje está diretamente relacionado à luta política. As músicas tratam de assuntos relacionados à valorização do trabalho, da mulher, dos direitos das minorias, da luta pelo acesso aos babaçuais que estão localizados em grandes latifúndios. São cânticos que refletem uma postura crítica e questionadora diante das condições de vida das trabalhadoras e suas famílias, que são entoados com voz firme e potente, em uníssono na maioria das vezes, e marcados pelo ritmo das ferramentas usadas na quebra: o machado e o porrete.
A criação do grupo ocorreu em 2004 com o apoio do MIQCB e da Assema, e realizou várias apresentações desde então identificado como As Encantadeiras. Sua formação reflete a abrangência geográfica do trabalho desenvolvido pelo Movimento das Quebradeiras contando com a participação de representantes das seis regiões onde a instituição possui representação. São elas: Dora, Moça e Silena, de Lago do Junco (MA); Nice, de Penalva (MA); Dijé, de São Luís Gonzaga (MA); Iracema, de São Domingos do Araguaia (PA); Francisca Lera, de Esperantina (PI); e Nonata, de São Miguel (TO).
ILUMIARA
É formado por cinco músicos da cidade de Belo Horizonte que também atuam como pesquisadores, sendo o único dos quatro grupos que não está relacionado a uma prática da tradição. Além das músicas apresentadas, o grupo traz em seu espetáculo a contextualização histórico-social dos cantos de trabalho no Brasil. Sua apresentação leva ao público um repertório de cantos de trabalho recolhidos da tradição, diretamente em suas fontes, ou a partir de registros de pesquisadores pioneiros como Mário de Andrade, Oswaldo de Souza e Ayres da Mata Machado. O grupo interpreta vissungos, cantigas de ninar, canto de lavadeiras, entre outros, em arranjos elaborados a partir de uma visão estética contemporânea. O Ilumiara é formado por Alexandre Gloor, Carlinhos Ferreira, Leandro César, Letícia Bertelli e Marcela Bertelli.