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Maior cobertura do país, na Zona Sul do Rio, está à venda por R$ 59 milhões

É típico do mercado: depois de um tempo sem atrair interessados, o imóvel à venda tem seu valor reduzido. No caso da cobertura do edifício Tucumã, na Praia do Flamengo, Zona Sul do Rio, o abatimento foi dos R$ 65 milhões cobrados em anúncios de 2021 para os atuais R$ 59 milhões pedidos pela proprietária.

Tudo ali é grandioso, do desconto no preço (R$ 6 milhões) às dimensões do tríplex com vista para o Aterro e a Baía de Guanabara — são 3.900 metros quadrados de área —, passando por sua história. Até onde se sabe, o vídeo que oferece um tour virtual pelo apartamento, publicado nas redes sociais, ainda não conquistou potenciais compradores, mas já fez muita gente sonhar acordada.

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No seu tempo de criança, Carlos Guinle sonhou de verdade por lá mesmo: membro de uma das famílias de trajetória mais tradicional (e rica) na alta sociedade carioca, ele nasceu em 1971 e viveu no palacete suspenso da Praia do Flamengo até os 8 anos. Com a repercussão do vídeo, publicou um comentário relembrando histórias do lugar que foi sua primeira morada. A partir daí, uma extensa conversa sobre o passado do imóvel veio à tona.

No livro “Os Guinle – A história de uma dinastia”, o historiador Clóvis Bulcão conta que o avô de Carlos, de quem ele herdou o nome, teve a ideia da construção do prédio, concluída em 1941, e mudou-se para o seu apartamento mais suntuoso.

Carlos Guinle, o neto, lembra que, no seu tempo, quem habitava a cobertura era seu tio-avô, o lendário playboy Jorginho Guinle.

— Éramos eu, meu pai, minha mãe e meus três irmãos. Eu tinha meu próprio quarto e até hoje lembro do meu berço. Cada filho morava num andar. Meu pai morava no primeiro. No segundo era o meu tio, conhecido como Baby Guinle, e o Jorginho, na cobertura. A gente assistia filme, tinha uma sala de cinema, fazíamos almoços na piscina. Isso eu lembro bem — diz Carlos.

Os andares do interminável apartamento são interligados por uma escada em forma de caracol, de mármore trazido da Europa, assim como o revestimento travertino (um tipo de mármore) das colunas na portaria do edifício. Lá no alto, o luxo espalha-se por cinco quartos, ambiente com pé-direito de 5,20 metros, salas de jantar, de estar e de jogos, além de piscina, duas saunas, jardim suspenso com árvores frutíferas, bar e adega.

— Praticamente tudo que está ali veio da Europa: as estátuas, mudas de planta, todo o mármore da casa. Eu lembro da torneira dourada do lavabo, que tinha uma ave lindíssima desenhada. A cuba era toda de latão martelado à mão — conta Carlos, sem disfarçar a saudade da bagunça que fazia: — Descia a escada escorregando de pijama até lá embaixo. Meu pai ficava desesperado.

Na rotina da família Guinle, as crianças faziam as refeições na copa: a sala de jantar era exclusividade dos adultos.

— Na sala de jantar aconteciam os negócios, os assuntos eram todos “de adulto”, a gente não participava. As únicas ocasiões em que jantava todo mundo na sala eram Natal e Ano Novo. Depois do jantar, eles iam para o salão fumar charuto, não tinha a ver criança estar com eles — relembra Carlos Guinle.

Celebridades no salão

Festas black tie eram frequentes na cobertura, que tem elevador e garagem privativos. Jorginho recebeu celebridades nacionais e estrangeiras em seus salões — chegou a hospedar o beatle George Harrison, em passagem pelo Rio.

— Era meio hipnótico sentar e conversar com ele. Meu tio era um poço de cultura sobre arte, música. Na década de 40 ele promovia jam sessions por lá, reunia amigos para ouvir um som e beber. Meu avô era muito amigo do (cantor e compositor) Dorival Caymmi, eles fizeram algumas parcerias nesses encontros. “Sábado em Copacabana” foi uma delas — rememora o neto orgulhoso.

Filha de Jorginho, Georgiana Guinle não chegou a morar na cobertura, mas a frequentou durante a infância. Segundo ela, sua mãe, Ionita Salles Pinto, não quis morar na cobertura por achá-la “grande demais”.

— A mamãe era meio refratária à ideia de morar lá, ela dizia que se sentia asfixiada por aquela imensidão, mas eu frequentava a cobertura todos os dias, ia brincar no jardim, que tinha um parquinho completo, e ia nas festas também — conta Georgiana, antes de recordar o folclore local: — Uma estátua gigantesca de mármore no canto do jardim era bem assustadora, apavorava as crianças. Alguns funcionários contavam que viam vultos e até ouviram o piano tocando sozinho.

‘Um imóvel especial’

O tríplex foi vendido para o empresário José Carlos Fragoso Pires na década de 1990 e, hoje, sua viúva busca negociá-lo. O valor, mesmo após o abatimento mais recente, está acima do praticado pelo mercado, na avaliação do corretor Claudio Castro.

— É um imóvel antigo, maravilhoso. O primeiro andar parece um palácio italiano, mas os demais já têm decoração mais dos anos 80 e 90. É importante notar que o andar do terraço já é mais de hoje em dia, dos anos 80, precisa de muita obra. É uma beleza, mas não é o gosto das pessoas hoje em dia. Quem tem recursos para comprar esse tipo de imóvel procura mais na orla de Copacabana, Ipanema e Leblon — avalia.

O corretor faz questão de ressaltar, no entanto, a importância histórica do imóvel.

— É um imóvel muito bom, especial, mas, na nossa opinião, não vale mais do que R$ 20 milhões. Isso não anula a evidência de que se trata de um dos mais emblemáticos endereços da cidade do Rio de Janeiro — analisa Castro. — O fato de não valer esse preço não tira seu mérito, que é o de mostrar que a cidade é viva e guarda uma rica história, atravessada pelas histórias das famílias Guinle e Fragoso Pires, nomes tradicionais da alta sociedade carioca.

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