Ícone do site Notícia Hoje

Laudo comprova que agrotóxico causou morte de abelhas em SC

Amostras enviadas a análise pela Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina (Cidasc) demonstraram que a morte repentina de abelhas no Planalto Norte, desde janeiro, foi causada por agrotóxicos. Os testes apontaram a presença de fipronil, um inseticida de uso veterinário e agrícola, aplicado em diversas culturas – em especial na soja. O mesmo produto foi responsável pela mortandade de abelhas no Rio Grande do Sul nos últimos meses.

A morte de abelhas por agrotóxicos é um problema mundial. O inseticida fipronil, que apareceu nas amostras em SC, foi apontado como causa para a perda de milhões de abelhas no Uruguai, recentemente, e na França, onde a substância foi proibida na agricultura.

Publicidade

Além do fipronil, pelo menos uma amostra, retirada de colmeias em Rio Negrinho, apresentou traços de um fungicida, trifloxistrobina, e outro inseticida, o triflumuron. Os casos são tratados como isolados pela Secretaria de Estado de Agricultura e Pesca, e não têm impacto significativo sobre a produção total de mel no Estado, que no ano passado foi de 8 mil toneladas. Mas acendem o sinal de alerta.

A morte repentina foi percebida pelos apicultores em meados de janeiro. Foram perdidas cerca de 20 milhões de abelhas em 300 colmeias, nas cidades de Canoinhas, Monte Castelo, Rio Negrinho e Itaiópolis, todas no Planalto Norte. A Epagri também recebeu relatos recentes em José Boiteux, no Alto Vale do Itajaí, e em Lebon Régis, no Meio-Oeste, que ainda precisam ser investigados.

Santa Catarina é o terceiro maior produtor de mel no Brasil, e o Estado que mais exporta. Hoje, 99% do mel catarinense que é enviado ao exterior é certificado como orgânico, por isso a Secretaria de Estado de Agricultura é cuidadosa ao tratar sobre a perda de colmeias por produtos químicos. Ressalta que o Estado tem hoje 9,7 mil produtores, e 315 mil colmeias em produção. O que significa que a mortandade ocorreu em menos de 10% das colmeias ativas.

— Temos que ter muito cuidado, e ressaltar que nessas condições (com a morte das abelhas) o mel não é aproveitado — diz o secretário adjunto de Agricultura e Pesca, Ricardo Miotto.

Casos são avaliados

A Cidasc e a Epagri têm técnicos em campo para avaliar cada caso, separadamente. Analisam a distância entre as colmeias e as lavouras, que tipo de cultivo existe nas proximidades, e se pode ter havido algum erro na aplicação de agrotóxicos – o que poderia ter facilitado a contaminação das abelhas.

Uma das hipóteses é a aplicação de produtos na soja durante a floração, período em que ela não é recomendada. Quando há flores, as abelhas vão em busca do néctar e podem entrar em contato com os inseticidas.

Ivanir Cella, chefe da Divisão de Estudos Apícolas da Epagri, diz que há uma série de cuidados a serem tomados na aplicação dos produtos, como atenção à direção do vento, e procurar fazê-la no fim da tarde, quando é menor a atividade das abelhas. Ele chama atenção para a necessidade de cobrar dos agricultores que sigam o que está determinado nos receituários de agrotóxicos.

_ O que está se pensando, porque isso nunca tinha acontecido no Estado, é em uma capacitação para os aplicadores _ disse.

Um dos maiores especialistas brasileiros em abelhas, o professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Aroni Sattler, avaliou os resultados do levantamento feito em SC. Ele diz que as análises são preocupantes e “apenas a ponta do iceberg”.

– Nós sabemos da importância do agro, não há dúvidas disso. Mas a que custo está se produzindo, e qual o efeito que isso tem? O apicultor está desamparado, e o agro ganha com as abelhas também. A parceria entre o agricultor e o apicultor deveria ser mais efetiva – avalia.

Estado reduziu mortalidade nos últimos anos

Dono de 150 colmeias que foram inutilizadas após a morte dos insetos – metade das perdas registradas no Estado este ano – o apicultor Alcides Frogel, de Mafra, terá um prejuízo de 20% em sua produção anual. Ele e outros apicultores da região vão se reunir nesta terça-feira (12) com o Ministério Público, para estudar uma solução.

A mortandade ocorre num momento em que o Estado comemorava redução no índice de perda das abelhas. Em 2008 os apicultores começaram a relatar a morte dos insetos com maior frequência, até o ápice, em 2011, quando 30% das colmeias foram perdidas em SC.

As causas, até então, não estavam relacionadas a produtos químicos. Foram doenças, provocadas por um ácaro e um fungo. Ao longo dos últimos 11 anos, o Estado conseguiu reduzir o índice de mortes a 14%, e aumentou a produção das colmeias, de 12 para até 25 quilos de mel cada uma. Isso ocorreu graças à seleção de abelhas-rainhas, para melhorar a produtividade, e do monitoramento de colmeias e de doenças pela Epagri.

No ano passado, esses números integraram um relatório entregue à Assembleia Legislativa, que questionou sobre a morte de abelhas no Estado. Embora não houvesse, ainda, registro de mortes causadas por produtos químicos, a Epagri já alertava, nesse documento, para o risco do uso indiscriminado de agrotóxicos – em especial o fipronil.

– É um inseticida muito eficiente, controla muito bem as pragas, e por isso é recomendado para dezenas de cultivos. Só que mata as abelhas junto. Outro aspecto á ser avaliado são as misturas de produtos (como apareceu nas análises de SC). Isso é muito grave porque atinge também as abelhas que estão na natureza, e não temos como dizer quantas delas morreram – alerta o pesquisador Aroni Sattler, da UFRGS.

Além das lavouras, o fipronil é usado para controle de insetos na produção de aves, por exemplo, e como princípio ativo para antipulgas usados em animais domésticos.

Abelhas e alimentos

– O mel tem papel importante na cadeia de exportações em Santa Catarina, mas não é o único produto afetado pela morte das abelhas. Estudos demonstram que elas são responsáveis pela polinização de 73% de todas as plantas do planeta.

– Por aqui, a saúde das abelhas está diretamente relacionada à produtividade do plantio de maças e ameixas. No caso das maçãs, 90% da polinização é feita por elas.

– Em SC, 95% das colmeias estão “alugadas” para polinização de macieiras.

 

 

Sair da versão mobile