Os testes de RT-PCR, considerado padrão ouro para diagnosticar o coronavírus, podem não reconhecer as variantes da Covid-19, como as do Reino Unido, Manaus e Estados Unidos.
Até o momento, já foram confirmados 146 casos de Covid-19 causados por novas variantes do coronavírus em Santa Catarina. Na Grande Florianópolis, uma pesquisa apontou que mais de 80% dos casos da doença, registrados nos últimos dias, são da variante de Manaus.
Todos os casos foram confirmados pelo Lacen/SC (Laboratório Central de Saúde Pública) e as amostras, encaminhadas para Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) do Rio de Janeiro, que realizou o sequenciamento genômico e atestou os resultados.
Recentemente, uma nova estirpe do coronavírus tem preocupado as autoridades francesas. A variante, detectada em um hospital, foi identificada apenas com testes sorológicos e coleta de matéria biológica, e não através dos testes PCR.
Considerando que as variantes são vírus que sofrem mutações em partes do genoma, o resultado falso negativo pode acontecer caso o laboratório não pesquise, no mínimo, dois ou três genes diferentes do vírus.
Para entender melhor como o exame funciona e quais as consequências desse resultado, o ND+ conversou com a médica Annelise Wengerkievicz Lopes, patologista clínica e diretora de um laboratório.
Resultados falsos negativos são comuns
De acordo com a médica, o resultado falso negativo é comum nos laboratórios, inclusive, para outras doenças que requerem testes. Estudos apontam que resultados desse tipo podem ocorrer em até 30% dos casos.
Quando mutações começam a ser registradas e existe a suspeita de que podem afetar o desempenho dos testes, o laboratório deve seguir um protocolo de validação.
Se, em determinado teste, recai a suspeita de que os resultados estão sendo prejudicados por uma nova variante, o primeiro passo, conforme a especialista, é questionar o fabricante.
“O fabricante faz testes com as novas cepas em várias amostras e emite um atestado para os laboratórios comprovando que o exame cobre essas mutações. Caso o fabricante ainda não tenha essa comprovação, o próprio laboratório pode realizar a testagem. É um procedimento habitual.”, explica.
Falso negativo contribui para disseminação do vírus
A patologista clínica diz que é preciso estar alerta para os possíveis falsos negativos. Isso porque um resultado de exame PCR falso negativo pode contribuir para o aumento de casos.
A pessoa infectada pode sair do isolamento social, deixar de usar a máscara corretamente e, ao ter contato com outros indivíduos, acabar contaminando um grupo maior de pessoas.
Por isso, é preciso que a pessoa avalie com cautela o seu caso. Se ela tiver tido contato direto sem os devidos cuidados com alguém que comprovadamente contraiu o vírus, a probabilidade de ter sido infectada é alta.
Portanto, um resultado negativo não pode ser levado ao pé da letra. E isso fica ainda mais evidente se a pessoa apresentar os sintomas típicos da doença. Na dúvida, o ideal é procurar um médico para auxiliar na precisão do diagnóstico.
“Se a pessoa tem sintomas, fez o teste e deu negativo, ela não deve descartar completamente a possibilidade de ser Covid-19. A data da coleta, uma coleta inadequada ou ainda a quantidade de vírus presente no nariz pode alterar o resultado do exame. Neste momento, em que precisamos urgentemente controlar a disseminação, se a pessoa tem qualquer suspeita mesmo com teste negativo, ela deve tomar todos os cuidados e manter o isolamento social”, alerta a médica.
Considerando que as variantes têm uma carga viral maior e são mais transmissíveis, outra orientação é que as pessoas perguntem nos laboratórios se é pesquisado mais de um gene do vírus e desconfiem de testes PRC muito baratos.
Como funciona o teste
A médica afirma que existem diversos testes RT-PCR disponíveis no mercado e que, em geral, as análises dos exames não se baseiam em um alvo só.
Sendo assim, é possível que os exames alcancem um resultado adequado mesmo com novas variantes em circulação.
Uma forma de se obter um resultado mais preciso é através de um teste RT-PCR, com três alvos, por exemplo: o gene S (Spike); o N (que é um gene de proteína presente no núcleo do vírus), e ORF (outro tipo de leitura do gene).
Se o reagente do teste não conseguir se conectar ao gene S, mas se ligar no gene N e no alvo ORF, o resultado será positivo para Covid-19. Essa alteração presente no gene S indica que o vírus sofreu uma mutação.
A patologista clínica explica que o exame RT-PCR não é capaz de identificar qual a variante específica do vírus, apenas a presença dele no organismo.
O sequenciamento genético do vírus é que vai revelar que a mutação no gene S se trata, especificamente, da variante do Reino Unido, por exemplo.
Se o exame tivesse como alvo apenas o gene S – que sofreu a mutação – o vírus não teria sido detectado no paciente. Isto é, o resultado seria um falso negativo.
Se no exame PCR for pesquisado duas ou três partes do genoma do vírus, há chances a mais de identificar a presença do coronavírus na amostra e reduzir o risco de um resultado falso negativo.
No dia 1º de janeiro, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) emitiu nota técnica justamente orientando os laboratórios sobre as novas cepas e a necessidade de se pesquisar mais de um gene do vírus para que o resultado seja preciso.
Com informações ND Mais