A crise no Canal de Suez pode em breve atingir o café instantâneo. Isso porque o navio encalhado que bloqueia a passagem está não apenas interrompendo os embarques de petróleo e gás natural liquefeito, mas também de contêineres de café robusta, usado no Nescafé.
A Europa é a mais afetada porque importa pelo Canal de Suez, mas o impacto será sentido globalmente, já que o atraso nos embarques agrava a falta de contêineres que já atinge o mercado de alimentos.
Essa escassez de contêineres também afeta os produtores de matéria-prima usada na fabricação de papel higiênico. Antes mesmo da crise de Suez, os fabricantes de celulose já vinham tendo problemas para exportar seu produto, situação que pode piorar se o cargueiro encalhado demorar para ser resgatado.
A brasileira Suzano embarca sua celulose principalmente em navios de carga geral, conhecidos como “break bulk”. Com o aumento da demanda por navios que transportam contêineres de aço, sobram menos embarcações usadas para levar a celulose, ameaçando as vendas da empresa para o exterior, disse o diretor-presidente da Suzano, Walter Schalka, em entrevista à Bloomberg.
Cerca de 12% do comércio global passa pelo Canal de Suez, e a hidrovia é mais conhecida por seu papel nos mercados de energia do que por commodities agrícolas, como o café.
Brasil não usa rota para exportar café
Apenas dois grandes produtores de café robusta — Brasil e Costa do Marfim— não usam essa rota-chave para atender grandes consumidores da Europa.
Mas, ao contrário de torrefadoras nos Estados Unidos, fabricantes de café da Europa não conseguem recorrer facilmente ao café robusta do Brasil devido ao sabor dos produtos.
Elas compram do Vietnã, maior produtor mundial, e mais recentemente vinham importando da África Oriental, que produzem um café de sabor mais suave, justamente para driblar a crise de contêineres.
No entanto, todos os grãos que a Europa importa da África Oriental e da Ásia fluem pelo Suez.
— As torrefadoras podem aguentar atrasos de duas a três semanas? Provavelmente, não — disse Raphaelle Hemmerlin, chefe de logística da trading Sucafina. — Não acho que disponham do estoque de reserva têm normalme.
No caso do papel higiênico, a escassez de contêineres que já afetava o setor coincide com o aperto na oferta global de celulose, que enfrenta no momento uma demanda forte puxada pelo maior consumo de papel higiênico e outros produtos ligados à cadeia desse insumo.
Schalka, da Suzano, teme que os problemas logísticos virem uma bola de neve e só piorem nos próximos meses. Interrupções significativas no comércio de celulose podem impactar o fornecimento de papel higiênico se os produtores não tiverem amplos estoques.
A Suzano já está preocupada com o risco de exportar menos do que a empresa esperava em março e ser obrigada a adiar alguns embarques para abril, disse Schalka.
Com o aumento da concorrência por navios de carga, as embarcações break bulk atracam nos terminais da empresa com menos frequência do que o normal.
– Todos os players sul-americanos que exportam via break bulk estão enfrentando esse risco – disse.
O Brasil é o maior fornecedor mundial de celulose, e a Suzano responde por cerca de um terço do fornecimento global do tipo de fibra curta, que é usado para produzir papel higiênico.
Crise afeta empresas como Ikea e Cartepillar
O bloqueio do Canal de Suez também já é motivo de dores de cabeça para empresas multinacionais, como a sueca Ikea e a Cartepillar.
A Ikea disse que está considerando todas as opções para garantir a disponibilidade de produtos, como camas planas e sofás, enquanto a Caterpillar está considerando o uso de transporte aéreo, se necessário.
A Seabay International Freight Forwarding Ltd., uma empresa que lida com produtos chineses vendidos em plataformas como a Amazon, tem de 20 a 30 contêineres nos navios esperando para cruzar o canal bloqueado, de acordo com seu proprietário, Mark Ma.
— Se o fluxo não puder ser retomado em uma semana, será horrível — disse Ma. — Veremos as tarifas de frete subirem novamente. Os produtos estão atrasados, os contêineres não podem retornar para a China e não podemos entregar mais mercadorias.
Com informações O Globo